O Manifesto comunista (Das Kommunistische Manifest), originalmente denominado Manifesto do Partido comunista (em alemão: Manifest der Kommunistischen Partei), publicado pela primeira vez a 21 de fevereiro de 1848, é historicamente um dos tratados políticos de maior influência mundial. Comissionado pela Liga dos Comunistas e escrito pelos teóricos fundadores do socialismo científico Karl Marx e Friedrich Engels, expressa o programa e propósitos da Liga.
O Manifesto comunista foi escrito no meio de um grande processo de lutas urbanas das Revoluções de 1848, chamadas também de Primavera dos Povos, um processo revolucionário de quase um ano que atingiu os principais países Europeus. Duas de suas maiores reivindicações foram as reformas sociais: a conquista da diminuição da jornada diária de trabalho de doze para dez horas e o voto universal, embora apenas para os homens.
Capa do Manifesto do Partido Comunista
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No prefácio de 1888, assinado por Marx e Engels, é descrito que o Manifesto foi a plataforma da Liga dos Comunistas, uma associação dos trabalhadores, primeiramente apenas alemães, depois já a nível internacional, "uma sociedade secreta". O congresso da Liga aconteceu em Londres, em 1847. Esboçado em alemão, em 1848, o manuscrito foi enviado à gráfica em janeiro de 1848, poucas semanas antes da revolução francesa de 24 de fevereiro. A primeira tradução inglesa foi realizada por Miss Helen Macfarlane e foi publicada no "Red Republican" em 1850.
Engels descreve que a insurreição em Paris foi derrotada em junho de 1848. Segundo ele a "primeira grande batalha entre o proletariado e a burguesia", a partir desta época a luta dos trabalhadores foi reduzida e, embora os movimentos independentes continuassem a mostrar sinais de vida, eram sistematicamente derrotados. A polícia prussiana perseguiu o comité central da Liga Comunista, localizada em Colónia. Os seus membros foram presos e depois de dezoito meses, foram julgados, em 1852. Sete deles foram condenados a penas de prisão entre três a seis anos, numa fortaleza. A Liga foi dissolvida pelos seus membros. A partir daí o manifesto foi condenado a um longo esquecimento, sendo hoje um dos livros mais lidos em todo o mundo, com traduções em todos os idiomas.
Conteúdo
Marx e Engels partiram de uma análise histórica, distinguindo as várias formas de opressão social durante os séculos e apelidaram a burguesia moderna como a nova classe opressora. Não deixaram, porém, de citar o seu grande papel revolucionário, tendo destruído o poder monárquico e religioso valorizando a liberdade económica extremamente competitiva. Realçaram ainda o aspeto monetário frio em detrimento das relações pessoais e sociais, tratando o operário como uma simples peça de um trabalho. Esse aspeto, juntamente com os recursos de aceleração de produção (tecnologia e divisão do trabalho), destruía todo o atrativo para o trabalhador, deixando-o completamente desmotivado e contribuindo para a sua miserabilidade. Além disso, analisaram o desenvolvimento de novas necessidades tecnológicas na indústria e de novas necessidades de consumo impostas ao mercado consumidor.
Afirmam sobre o proletariado: "Sua luta contra a burguesia começa com sua própria existência". O operariado, tomando consciência de sua situação, tende a se organizar e lutar contra a opressão, e ao tomar conhecimento do contexto social e histórico onde está inserido, especifica seu objetivo de luta. Sua organização é ainda maior pois toma um caráter transnacional, já que a subjugação ao capital despojou-o de qualquer nacionalismo. Outro ponto que legitima a justiça na vitória do proletariado seria de que este, após vencida a luta de classes, não poderia legitimar seu poder sob forma de opressão, pois defende exatamente o interesse da grande maioria: a abolição da propriedade (“Os proletários nada têm de seu para salvaguardar”).
O Manifesto Comunista faz uma dura crítica ao modo de produção capitalista e à forma como a sociedade se estruturou através dele. Procura organizar o proletariado como classe social capaz de reverter a sua precária situação e descreve os vários tipos de pensamento comunista, assim como define o objetivo e os princípios do socialismo científico.
A exclusividade entre os proletários conscientes, portanto comunistas, segundo Marx e Engels, é a de que visam a abolição da propriedade privada e lutam embasados num conhecimento histórico da organização social. São, portanto, revolucionários. Além disso, destaca que o comunismo não priva do poder de apropriação dos produtos sociais: apenas elimina o poder de subjugar o trabalho alheio por meio dessa apropriação. Com o desenvolvimento do socialismo a divisão em classes sociais desapareceria e o poder público perderia o seu caráter opressor.
No terceiro capítulo, analisa e critica os três tipos de socialismo. O socialismo reacionário, que seria uma forma de a elite conquistar a simpatia do povo procurando manter as relações de produção e de troca; o socialismo conservador, com seu caráter reformador e antirrevolucionário; e o socialismo utópico, que apesar de fazer uma análise crítica da situação operária não se apoiava em qualquer luta política, tornando a sociedade comunista inatingível.
Por fim, no quarto capítulo fecha com as principais ideias do Manifesto, com destaque para a questão da propriedade privada e motivando a união entre os operários. Acentua a união transnacional, em detrimento do nacionalismo esbanjado pelas nações, como manifestado na célebre frase: Proletários de todos os países, uni-vos!
Em suma, o Manifesto Comunista apoia um governo transitório com os seguintes propóstitos:
- Abolição da propriedade da terra e seu rentismo.
- Uma tributação progressiva.
- Abolição dos direitos sobre a herança
- Confisco das propriedades de rebeldes e foragidos.
- Centralização do crédito pelo atacado nas mãos do Estado em apoio a cooperativas de microcrédito.
- Estatização total das empresas de transporte e comunicação.
- Estatização dos meios de produção, da agricultura e das fábricas de forma planejada.
- Apoie a igualdade entre todas as formas de trabalho além da criação de um corpo de funcionários públicos voltados para a agricultura.
- Integração completa entre campo e cidade.
- Educação infantil universal em escolas públicas, proibição do trabalho infantil e integração entre mundo fabril e mundo escolar.
Lenin e o Manifesto Comunista
Na sua obra "O Estado e a Revolução" de 1918, Lenin comentou a posição de Marx, vinte anos depois de publicado o Manifesto. No capítulo "A Experiência da Comuna de Paris - Análise de Marx", o autor fala sobre a experiência da Comuna de Paris de 1871, o primeiro governo operário da História, e descreve os cuidados de Marx com a sublevação.
Marx afirmou que "que qualquer tentativa para derrubar o governo era uma tolice ditada pelo desespero". Mas, continuou Lenin, quando, em março de 1871, a batalha decisiva foi imposta aos operários e estes a aceitaram, quando a insurreição se tornou um fato consumado, Marx saudou com entusiasmo a revolução proletária. Marx não mudou de opinião, mas percebeu ser necessário estar junto do movimento, porque via nele "uma experiência histórica de enorme importância, um passo para a frente na revolução proletária universal, uma tentativa prática mais importante do que centenas de programas e argumentos."
Ao analisar essa experiência, Marx apontou uma única "correção" que julgava necessária introduzir no seu Manifesto Comunista, escrita no seu último prefácio à obra, de 24 de junho de 1872. Karl Marx e Friedrich Engels afirmavam ali que o programa do Manifesto estava "envelhecido em alguns pontos". A Comuna havia demonstrado que "não basta a classe operária apoderar-se da máquina do Estado para adaptá-la aos seus próprios fins." Para Lenin, a ideia de Marx apontava claramente que a classe operária deveria quebrar, destruir a "máquina do Estado", não se limitando apenas a assenhorear-se dela.
Para Lenin a observação de Marx apontava para a destruição da máquina burocrática e militar do Estado, que seria a "condição prévia de qualquer revolução verdadeiramente popular". Assim, depois da revolução de 1848-49, o poder do Estado tornou-se "o grande instrumento nacional da guerra do Capital contra o Trabalho", sendo necessário assim destruí-lo, proposta que não estava clara no Manifesto de 1848. (V. Lenin. O Estado e a Revolução. 1918.)
Trotsky e o Manifesto
Num artigo comemorativo dos "90 Anos do Manifesto Comunista", a 30 de outubro de 1937, Leon Trotsky reafirmou a atualidade desta publicação, com as "partes mais importantes" parecendo terem sido escritas ontem". Descreveu que os seus jovens autores (Marx tinha 29 anos e Engels 27 anos) souberam "antever o futuro como ninguém antes e como poucos depois deles". Trotsky também retomou o prefácio do Manifesto de 1872, onde os autores declararam que, "mesmo tendo certos trechos secundários do manifesto envelhecido", [Marx e Engels] não se sentiam no direito de modificar o texto original, visto que, "no decorrer dos vinte e cinco anos então passados ele já se transformara num documento histórico". Trotsky considerou que, em 1937, noventa anos da sua publicação, outras partes isoladas envelheceram ainda mais" e descreveu as suas críticas:
No seu prefácio Trotsky apresentou resumidamente algumas ideias do Manifesto que "até aos nossos dias conservam integralmente a sua força" e citou outras que necessitavam de sérias modificações ou complementos. Para ele as principais ideias que resistiram ao tempo foram: "A conceção materialista da História", um dos mais preciosos instrumentos do pensamento humano; "A História de todas as sociedades até os nossos dias não foi senão a história pelas lutas de classes.", onde Trotsky afirmava que as frentes populares defendidas pela Internacional Comunista à época, negavam as leis da luta de classes; "A anatomia do capitalismo", descrita por Marx no seu Capital (1867); "A tendência do capitalismo em rebaixar o nível de vida dos operários"; as "crises comercial-industriais como uma série de crescentes catástrofes"; "O governo moderno nada mais é do que um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa"; "Toda luta de classe é uma luta política" ou seja organização dos proletários em classe é, consequentemente, a sua organização em partido político..."; que o proletariado "não pode conquistar o poder por meio das leis promulgadas pela burguesia"; "é necessário que a classe operária concentre nas suas mãos o poder capaz de varrer todos os obstáculos políticos", "O proletariado organizado em classe dominante", e que "quanto maior for o número de Estados que se lançarem no caminho da revolução socialista, mais livres e flexíveis serão as formas da ditadura, mais ampla e profunda será a democracia operária"; "o caráter internacional da revolução proletária"; que o socialismo se constitui com a extinção do Estado; e, finalmente, que "Os operários não têm pátria" (Trotsky, 90 Anos do Manifesto Comunista).
Trotsky focou: Marx apontou a conceção de que "o capitalismo é o reino da livre concorrência", entretanto, anos depois, em O Capital de 1867 Marx teria constatado a tendência para a transformação da livre concorrência em monopólio", entretanto realçou que a caracterização "científica do capitalismo como um monopólio" foi uma contribuição de Lenine, feita na sua obra de 1917 "Imperialismo, Estágio Superior do Capitalismo", além disto a critica à literatura socialista feita por Marx e Engels, estaria ultrapassada, pois, em 1937, a Internacional Comunista dirigida por Stalin colocava outras questões, uma vez que estava a massacrar "a vanguarda do proletariado espanhol" na Guerra Civil Espanhola, abrindo o caminho para o fascismo. Trotsky concluiu afirmando que a longa crise da revolução internacional cada vez mais se transformaria "em crise da cultura humana", e que esta seria, no fundo, a "crise da direção revolucionária do proletariado" (Trotsky, 90 Anos do Manifesto Comunista).